The Geopolitics of Rare Earths and China

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23 JANUARY 2024
The Geopolitics of Rare Earths and China

A extração mineral tem-se tornado cada vez mais relevante no contexto geopolítico e no controlo estratégico das cadeias logísticas por grandes potências globais, como a China e os Estados Unidos. Um exemplo em particular são os 17 elementos geralmente designados de Elementos Terras Raras (ETR), conhecidos por serem tradicionalmente usados na indústria do vidro e na metalurgia. No entanto, popularizaram-se também pelo papel fundamental que possuem na transição verde e digital, sendo essenciais em tecnologias como turbinas eólicas, painéis solares e até mesmo em smartphones. Como resultado, a atenção dedicada a estes elementos não provém apenas de entidades estatais, como mencionado anteriormente, mas também de grandes bilionários como Bill Gates e Jeff Bezos.

Com minas a produzir ETR um pouco por todo o mundo, o Ártico é uma das regiões de maior destaque quanto ao potencial para a extração desses materiais. Por outro lado, os efeitos das alterações climáticas e a consequente redução da cobertura de gelo em todo o Polo Norte criaram, ironicamente, melhores oportunidades para explorar o potencial comercial e estratégico dessa região. O degelo facilita o acesso a áreas do Ártico anteriormente inacessíveis, resultando na emergência de novos locais para a exploração e extração dos ETR. Assim, à medida que o Ártico se torna um ponto nevrálgico para dinâmicas geopolíticas, desencadeia-se uma nova corrida por recursos na região.

A China, atualmente, detém cerca de 70% da produção global de minas e possui pelo menos 85% da capacidade de processamento mundial, destacando-se como a força predominante nesse mercado industrial. Mas nem sempre foi assim. Dos anos 1950 até meados dos anos 80, o controlo desse mercado estava consolidado nos EUA. A China apenas se tornou um produtor e exportador significativo de ETR por meados da década de 70, que corresponde também a uma altura em que os EUA lidavam com um incremento nos movimentos ambientalistas, com uma crescente tendência de desindustrialização e realocação das indústrias norte-americanas. Inclusive, a mina mais produtiva e importante dos EUA acabou por cessar funções já em 2002, mas ainda em função desses fatores.

Pouco depois, pelo início dos anos 80, a liberalização da economia chinesa e mais tarde as políticas direcionadas à indústria de mineração levadas a cabo por Deng Xiaoping acabaram por permitir que empresas internacionais estabelecessem operações no país asiático, contribuindo assim para o saber-fazer tecnológico local. A capacidade da China para produzir cloretos e óxidos mistos de terras raras atingiu aproximadamente 10.000 toneladas em 1985. Foi então nessa fase que a China consolidou totalmente a sua hegemonia nessa indústria. O encerramento de minas nos EUA, bem como em outros países como o Japão, levou a uma crescente dependência destes em relação ao mercado chinês de ETR, que ainda hoje se sente. E, apesar do reconhecimento pelos Estados Unidos da necessidade de reduzir a dependência com respeito ao mercado chinês, dados recentes mostram que os EUA importaram cerca de 74% dos seus ETR da China entre 2018 e 2021.

De forma a consolidar o seu controlo na produção e exportação desses elementos, a China olha agora para o Ártico. Neste contexto, a Gronelândia, apesar de ter alcançado a independência em relação àda Dinamarca em 2009, enfrenta ainda o desafio significativo de diminuir a sua dependência dos subsídios dinamarqueses, que continuam a representar cerca de metade do seu orçamento público. A descoberta de depósitos substanciais de ETR no seu território atraiu a atenção não apenas da China e das nações ocidentais, mas também do seu, agora independente, governo, que está cada vez mais inclinado a acolher investimento estrangeiro.

Mais concretamente, o projeto Kvanefjeld, localizado no sul da Gronelândia, destaca-se como um ponto central de interesse para os intervenientes chineses devido ao seu estatuto como depósito multi-elementar rico em ETR, urânio, zinco e flúor. Detido pela Greenland Minerals and Energy (GME), o projeto Kvanefjeld representa uma importância estratégica, tanto pelo seu potencial em recursos como pelas suas implicações geopolíticas. A Shenghe Resources, detentora de uma participação de 12,5% na GME, tem contribuído com tecnologia e conhecimento para todo o projeto, cuja relevância estende-se também à Iniciativa Cinturão e Rota chinesa. Em conjunto também com a China Communications Construction Co. (CCCC), têm sido feitos estudos de viabilidade, incluindo esforços colaborativos provenientes da joint venture entre a Shenghe e subsidiárias da China National Nuclear Corporation (CNNC), de forma a importar e processar ainda mais ETR de Kvanefjeld. O envolvimento da China em vários projetos de ETR na Gronelândia, incluindo o de Kvanefjeld e outros, como o de Kringlerne (Tanbreez), reforça a intenção de garantir a hegemonia chinesa, abrangendo outras regiões com o potencial de deter alguns dos maiores depósitos de ETR do mundo.

No entanto, ainda existem alguns desafios à extração mineral no Ártico, em muito semelhantes aos desafios colocados pela extração de hidrocarbonetos. Apesar da crescente viabilização dessas práticas, as condições climáticas da região continuam a colocar dificuldades e entraves à exploração desses elementos e minerais. No que concerne à sua localização bastante remota, há uma enorme necessidade de infraestruturas como estradas de mais fácil acesso, bem como, complexas formas de manutenção desses equipamentos.

Mas não só no plano tecnológico são colocados desafios a projetos como o de Kvanefjeld. Preocupações relacionadas com fatores ambientais, como a eliminação de resíduos radioativos que estão intrinsecamente associados aos depósitos de urânio, têm sido também fonte de discussão na Gronelândia. Na verdade, nas eleições de 2021, o partido socialista de Múte Bourup Egede, que acabou eleito, tinha como causa a cessação do projeto mineiro com vistas a melhorar as condições ambientais e a prevenir riscos de toxicidade. Quando chegou ao poder, Egede iniciou negociações entre o governo da Gronelândia e a Greenland Minerals and Energy de forma a mitigar os efeitos ambientais potencialmente custosos para a sua população. No entanto, apesar das negociações, o projeto Kvanefjeld continua de pé e a Shenghe Resources continua a desempenhar um papel de grande relevo no seu seio. A China continua a considerar a Gronelândia e outras regiões do Ártico como áreas estratégicas para desenvolver ainda mais o seu domínio económico nas cadeias logísticas do mercado global, especialmente no que diz respeito à obtenção de recursos naturais valiosos, como minerais e ETR, abundantes nesses territórios.

Nesse sentido, também a Rússia enfrenta desafios para não se tornar extremamente dependente da China no que tange à mineração, especialmente após as sanções do ocidente a terem aproximado ainda mais do dragão amarelo. Atualmente, a Rússia ocupa o segundo lugar a nível mundial em reservas de ETR, embora a sua extração interna represente menos de 2% do total global. A produção anual de ETR na Rússia varia entre 2.600 a 2.700 toneladas, sendo que menos de 5% passam por processamento. Como seria então de esperar neste cenário limitado de produção, a Rússia importa 90% das terras raras processadas que consome, principalmente da China. E, embora ainda não seja uma realidade, analistas geopolíticos e especialistas em recursos minerais e terras raras sugerem que os desafios de produção na Rússia poderão atrair investimento chinês. De acordo com Jack Lifton, membro sénior do Instituto de Análise da Segurança Global, a China está inclinada a financiar projetos russos como Tomtor[skoye], que estaria geograficamente mais próximo de Beijing do que de Moscovo.

Por fim, o envolvimento chinês não só no mercado global, mas em concreto no Ártico, tem impulsionado uma resposta norte-americana ainda tímida no que toca à abertura de infraestruturas e minas de exploração de recursos minerais. O Alasca mantém-se como a escolha óbvia para os EUA, e o potencial da Mina Red Dog estará então a ser considerado para a recuperação de minerais críticos, enquanto novos projetos, como o Projeto Bokan-Dotson Ridge REE, destacam os esforços do país para estabelecer centrais de processamento e reduzir a dependência de importações chinesas. A Ucore Rare Materials, empresa norte-americana, tem ainda como objetivo desenvolver uma planta de processamento e separação para ETR como parte desse projeto.

À medida que as nações lidam com as complexidades do mercado global de ETR, a busca por fontes alternativas levou ao Ártico, onde as tensões geopolíticas, as controvérsias ambientais e os interesses económicos se entrelaçam. Os depósitos de ETR da Gronelândia, actualmente no centro das atenções de investidores globais e da China, destacam a importância da região na garantia de uma cadeia de abastecimento estável para esses minerais críticos, e para a contínua competição pela supremacia deste mercado por parte da China, ou pela redução da dependência dos EUA e de outros países como o Japão em relação ao mercado chinês.

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