A recente escalada militar entre Israel e Irã, especialmente após os ataques israelenses contra refinarias, campos de gás e infraestruturas estratégicas iranianas, não apenas agravou a instabilidade regional, como também expôs um novo teste para a política externa da China no Oriente Médio. O episódio evidencia os dilemas enfrentados por Beijing: equilibrar segurança energética, estabilidade regional e projeção de soft power, sem comprometer sua relação econômica com os Estados Unidos e seus interesses comerciais com o Ocidente.
Historicamente, a China manteve uma política de distanciamento em relação aos conflitos no Oriente Médio, restringindo seu envolvimento a temas essencialmente econômicos e energéticos [1]. No entanto, nas duas últimas décadas – e com maior intensidade desde a ascensão de Xi Jinping – Beijing passou a adotar uma estratégia mais assertiva e multifacetada [2].
Esse novo perfil inclui:
Parcerias bilaterais estratégicas com atores-chave como Irã, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Egito [2];
Participação crescente em fóruns multilaterais, como o Fórum de Cooperação China-Estados Árabes (CASCF) e a Organização de Cooperação de Shanghai (SCO) [2];
Expansão de investimentos via a Iniciativa Cinturão e Rota (BRI) [2];
E mais recentemente, uma postura diplomática mais visível, como demonstrado na mediação entre Arábia Saudita e Irã em 2023 [2].
O vetor central da presença chinesa na região continua sendo a segurança energética. Aproximadamente 50% do petróleo consumido pela China vem do Oriente Médio, com destaque para Irã e Arábia Saudita [1][3].
A possibilidade de um bloqueio do Estreito de Ormuz, ou de uma interrupção nas rotas pelo Mar Vermelho e Canal de Suez, representa uma ameaça direta aos interesses vitais de Beijing [3]. A recente ofensiva israelense acentuou essa vulnerabilidade [3].
Analistas do Institut pour la Paix et la Diplomatie destacam que qualquer disrupção prolongada nessas rotas pode comprometer não apenas a segurança energética chinesa, mas também os pilares da estratégia de conectividade logística global promovida pela BRI [2][8].
Diante do agravamento da crise, a China intensificou sua diplomacia pública e privada. O ministro das Relações Exteriores chinês, Wang Yi, telefonou aos seus homólogos de Irã e Israel, condenando explicitamente os ataques israelenses como uma violação da soberania e integridade territorial do Irã, segundo reportagens da CNN, Reuters e Xinhua [5][6][8].
Beijing também reforçou sua disposição de "exercer um papel construtivo na busca por uma solução pacífica" [8], mas mantém o cuidado retórico de apelar igualmente para que ambas as partes optem pelo diálogo [6].
Essa postura reflete o que a literatura de Relações Internacionais vem chamando de "neutralidade ativa": uma combinação de defesa pública de princípios (soberania, não intervenção, resolução pacífica de conflitos) com a manutenção de canais diplomáticos com todos os lados envolvidos, evitando rupturas drásticas com nenhum dos principais atores [2][4][7].
Um elemento adicional de contenção é o risco de sofrer sanções secundárias dos EUA. Washington já impôs sanções a entidades chinesas por comércio de petróleo com o Irã e fornecimento de componentes químicos para a indústria de defesa iraniana [8].
Beijing, que busca estabilizar suas relações comerciais com os Estados Unidos, sabe que um alinhamento excessivo com Teerã pode prejudicar negociações bilaterais cruciais em curso, incluindo as tratativas comerciais e tecnológicas [3][8].
Por isso, a China limita sua atuação ao campo diplomático e declaratório, evitando qualquer ação que possa ser interpretada como apoio operacional ao Irã [2][3].
O atual conflito entre Israel e Irã reafirma um dilema da diplomacia chinesa no Oriente Médio: De um lado, a China é pressionada por suas necessidades energéticas, pela instabilidade logística e pelo desejo de afirmar-se como potência global responsável.
De outro, seu envolvimento direto traz custos geopolíticos e econômicos elevados, especialmente no tocante à sua relação com os Estados Unidos e à sua vulnerabilidade comercial.
A tendência para os próximos meses será a de uma retórica mais visível pela paz, acenos públicos à diplomacia, mas sem mudanças substanciais na postura de uma cautela mais estratégica.
Beijing continuará, portanto, a navegar entre os imperativos do realismo econômico e as exigências simbólicas de uma potência emergente, sempre buscando minimizar riscos e maximizar sua margem de manobra diplomática, sem, contudo, colocar em risco sua prioridade maior: a segurança de suas fontes de energia [1][2][8].
[1] Center for Strategic and International Studies (CSIS). China and the Middle East. [2] Institut pour la Paix et la Diplomatie. China’s Expanding Influence in the Middle East. [3] Forecasting China’s Strategy in the Middle East Over the Next Four Years. [4] Global Times. China condemns Israel’s violation of Iran’s sovereignty. [5] Reuters. China's UN envoy condemns Israeli strikes on Iran – state media. [6] Xinhua Commentary. China champions peace and stability in the Middle East through concrete actions. [7] Revista Fórum. Israel x Irã: China se posiciona sobre a tensão no Oriente Médio. [8] CNN – Simone McCarthy. China condemns Israel attack on Iran as it looks to show itself as a potential peace broker.
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